Leila Gato dedica-se à arte de bem comer. Mas o verdadeiro lema de vida são as suas "Torradas com Galão". De uma ideia que consistia na criação de um guia gastronómico de cafés e padarias em Lisboa, passou para a construção de um vídeo-log onde vai entrevistando várias personalidades enquanto se trincam tostas e torradas de bom pão, barradas com boa manteiga (e vá, uma vez ou outra, queijo). Os espaços são sempre diferentes, e os temas, são os que os convidados quiserem arriscar. Nesta entrevista contudo falamos com Leila sobre pão, galões, memórias de infância e o crescimento pessoal de uma filha do campo, saloia, como quase todos nós, que se deixou conquistar pelas luzes do Cinema e da cidade.
Leila, como te
definirias? Uma amante de pão, uma viciada de amor por café, uma viciada em
manteiga, amante de boa comida ou todas as anteriores? Porquê?
Todas as hipóteses (responde com um sorriso maroto).
Primeiro sou uma amante da boa comida, depois do pão e por último de café.
Quando digo que “comida é amor” é realmente algo que vem do coração e isso faz-me
viajar no tempo quando comia o pequeno-almoço com os meus pais antes de ir para
a escola. Hoje em dia eu posso fazer em qualquer hora do dia. Eu sou realmente
feliz se, ao chegar a casa, tenho apenas para comer uma torrada com manteiga e
um galão.
Do Cinema/Teatro para
o mundo do Marketing, Blogger, entrevistas, como descreves o processo de
evolução e transformação?
Mudar é algo muito natural para mim. Eu aceito e abraço a
Mudança como um degrau necessário para crescer tanto pessoal como
profissionalmente. O Cinema sempre fez parte da minha vida desde a infância.
Lembro-me de ver filmes quando era muito pequena embora não percebesse o que se
estava a passar no ecrã. À medida que os anos passaram e comecei a ir para a
escola, para o secundário, comecei a poupar as minhas mesadas para ir ao cinema
e comprar revistas sobre filmes. Lembro-me de fazer pesquisas sobre determinado
actor ou actriz e realizador. Depois da faculdade, na Escola Superior de Teatro
e Cinema, percebi que o meu amor à arte seria sempre perfeito se eu não o
levasse para um ambiente de trabalho, e acabei por me relacionar mais com
Comunicação de Marcas, passando por uma agência de moda enquanto Relações
Públicas e Assistente de Comunicação até ter decidido fazer um mestrado em
Marketing Digital. Através da Direcção e Gestão de conteúdos para redes sociais
e por toda a questão tecnológica que está associada percebi que o que gosto
mesmo de fazer é interagir com as pessoas. Dar um toque mais pessoal ao meu
blog e falar com as pessoas enquanto estas estão num momento mais relaxado, que
é o de comer, é o que eu faço hoje em dia, então vamos ver o que o futuro traz.
De Pinheiro de Loures
até Lisboa, achas que te podes chamar de filha da urbe citadina? Qual pensas
ser a diferença entre o pequeno-almoço tradicional familiar e o pequeno-almoço
do estilo de vida moderno?
Eu serei sempre uma rapariga de uma vila pequena maravilhada
com a cidade grande. Embora Pinheiro de Loures não seja assim tão longe de
Lisboa, é um lugar com pouca oferta. Quando comecei a ir todos os dias a Lisboa
por época da faculdade, ficava deslumbrada com tudo o que ia descobrindo nas
minhas viagens. Hoje vejo Lisboa como a minha cidade mas adoto a sensação de
ter um local onde me sinto segura e que posso sempre visitar. Um lugar onde
estão as minhas memórias de infância. O pequeno-almoço era uma coisa de família,
e havia duas tradições: tomá-lo com os meus irmãos, repetindo o numero de
torradas que quiséssemos e ver desenhos animados, e a segunda, ir a um dos
cafés perto de casa e, não importando o quão bem cheiravam os bolos acabados de
fazer, eu preferia sempre comer pão com manteiga e beber um galão. Acredito que
as coisas em Lisboa não fossem ou sejam assim tão diferentes, uma vez que
torradas e galões comem-se em todo o lado. Locais diferentes com diferentes
pessoas, mas tradições idênticas!
Torradas com Galão: o
que se esconde por detrás do nome, o objetivo da ideia e a própria ideia. Qual
o processo criativo e o motor que te fizeram começar com este projecto?
Uma vez que as minhas melhores recordações de juventude são
comer torradas e beber galões junto dos meus pais, hoje, quando faço o mesmo, é
como estar a saborear esses mesmos momentos. Para mim a associação com o
projecto foi feita de forma muito imediata. A ideia original era realizar um
mapa das melhores “Torradas com Galão” da cidade, explicando porque eram
merecedoras de se visitarem e contar um bocadinho das histórias dos cafés,
pastelarias. A ideia ficou adormecida por alguns anos até que um dia uma amiga
minha desafiou-me a fazer um vídeo. O conceito desenvolveu-se e apostámos num
episódio piloto no qual eu falaria com alguém num café enquanto se comiam
torradas. A partir daí a conversa pode evoluir de acordo com o convidado. Foi
muito fácil apaixonar-me por esta ideia, uma vez que, obviamente, adoro
pastelarias e cafés e adoro falar. Tenho apenas que encontrar os locais certos
e as pessoas mais interessantes que tornem cada programa único e também é uma
forma de alertar as pessoas para os locais mais “cool” de Lisboa e partilhar
dois dedos de conversa.
Padarias tradicionais
ou cafés de “Instagram”? O que achas que pode ser melhorado de forma que os
antigos cafés não percam a sua identidade, perante os novos espaços da moda?
A competição é vigorosa. Hoje por cada 100 novos espaços que
abrem, 101 encerram portas e existe sempre algo novo a explorar. Eu prefiro as
padarias tradicionais mas acho que existe sempre espaços para improvisar e
providenciar um bom serviço. Se os produtos como o pão, a manteiga usada, a
farinha e o leite são de qualidade superior, então as pessoas irão regressar
certamente. Outra coisa que vem sendo essencial é aceitar a ajuda das redes
sociais – a opinião dos influenciadores ajudam a passar a mensagem, mas é
essencial a comida ser de boa qualidade. Eu tenho conhecido tanta gente no “mundo
da comida” e quero muito mais. Tento sempre dizer a quem tem um novo espaço que
seja sempre honesto para consigo e para com os clientes: se o que fazem é pão,
então façam pão, não tentem fazer panquecas cheias de chocolate e açúcar que só
irão ficar bem para a “fotografia”.
Qual o pão perfeito e
qual a padaria perfeita? Tens algum lugar favorito em Lisboa?
Felizmente hoje em dia existem vários locais onde podemos
encontrar pão de qualidade em Lisboa. Para mim um bom pão só precisa de 3
ingredientes (farinha e fermento, água e sal). Aprendi recentemente que existem
mais 2 ingredientes que podem ser adicionados: amor e tempo. Se o pão for feito
com tempo será muito mais saudável e irá ter um sabor muito similar com aquele
da nossa infância. Locais como a Terrapão, Isco e Gleba fazem um trabalho
excelente no que toca à criação de pão na cidade. Para mim terá de ser crocante
e ter uma crosta caramelizada com um sabor mais ácido. Também sou uma apaixonada
pelo pão artesanal da Lab (Padaria Portuguesa) que está igualmente a fazer um ótimo
serviço na confeção de pão a preços acessíveis para todos os bolsos (o que é
essencial nos dias de hoje, embora seja um bem de primeira necessidade). Mas
sim, existem sempre formas de melhorar e lançar novos tipos de pães no mercado.
O paraíso de Pão para mim.
Consideras então
criar um guia no future que inclua as novas e as velhas padarias, contando as
histórias à medida que vais apresentando novas criações?
Sim, é algo que sempre esteve nos meus sonhos e planos. Algo
que envolva ilustração e storytelling, ou outro tipo de arte! Existem tantas
histórias por contar, casais de que trabalham juntos, negócios herdados dos
pais ou dos avós, sítios antigos que são recuperados e que abrem portas com um
olhar mais moderno. É tudo uma questão de ter tempo e começar a falar com essas
pessoas que o conteúdo será sempre rei. Se encontrar uma forma de contar uma
boa história todos vão querer conhecer e contá-la também e eu acredito mesmo
nisto!
(Entrevista originalmente produzida e publicada em A City Made by People)
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