January 2019 - Cláudia Paiva Silva

Wednesday, January 16, 2019

Gillete. É p'ró menino e para o Homem he-ho!
January 16, 20190 Comments
Vi ontem o malfadado anúncio da Gillete. Se é para gerar polémica, controvérsia, falatório, censura, desgosto (dizem as estatísticas que a maioria das pessoas não gostou das imagens) e com isso, mais dinheiro, sinceramente não interessaria para o caso. O assunto abordado na publicidade referida, sim. É importante, de forma a ser mais curta na intervenção, apenas explicar o seguinte (que, vale o que vale, porque é a minha opinião e eu não sou psicóloga nem socióloga para elaborar muito mais do que isto): o anúncio não é apenas mal visto por parecer mais uma montagem do (im)popular MeToo. Muito pelo contrário - aqui o problema nem são as mulheres, mas sim os homens, os seus comportamentos e atitudes do dia-a-dia. A premissa inicial é apenas realçar que aquilo que o homem "é", deveria ser na verdade o que ele "deveria ser", passo a redudância. O que choca os espectatores não é ser pro-feminista ou anti-machista. Não! É mesmo pelo facto de ser um vídeo machista, misógino e mundialmente enraizado em toda e qualquer sociedade. O que chateia mesmo as pessoas não é o incómodo que possa transmitir, mas sim o facto de serem coisas que acontecem todos os dias, que já ninguém liga (ou talvez liguem, mas pensem que nem vale a pena comentar), e como tal, estar-se talvez a perder tempo com situações vistas como "normais". Não, não é normal. Não é normal continuarmos a dizer que o menino brinca com carros, anda à bulha, tem força física e portanto pode volta e meia dar uns murros aos outros, deve jogar futebol, não é (totalmente) preciso saber fazer alguma coisa em casa e claro, não chora, não é fraco, não é nem nunca será vítima. Os homens também são vítimas, mas o entendimento que a sociedade lhes dá é que não o podem ou devem mostrar, com pena de serem imediatamente apelidados de fracos, de maricas, ou de coisa pior. 





Antes de criticar, dever-se-ia pensar, e bem, no que andamos realmente a fazer para que as situações que todos os dias dizemos que têm de acabar, acabem mesmo. Não basta aparecer na televisão ou numa publicação escrita e falar sobre direitos iguais. Dever-se-ia sim era falar sobre educação igual, ou educação num todo, não desterrando cor-de-rosa para um género e azul para outro, e um arco-íris para os demais. Igualdade de género passa sobretudo pela igualdade na forma de se educar. E se educamos as meninas a serem bem comportadas, serem educadas e saberem passar a ferro, além de ensinarmos os rapazes a ter a barba bem aparada, porque não ensinar que não há mal nenhum em mexer em tachos e panelas e que a maquina de lavar roupa não é nenhum bicho-papão? 



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Monday, January 14, 2019

Leituras #2
January 14, 20190 Comments
cheguei a casa.
espanto meu em prestar atenção a algumas notícias que iam passando na tv. Esse bicho primitivo que nos molda a cabeça e as opiniões dos fracos de espírito.
e começo a escutar algo que me deixa incrédula, que me traz lágrimas aos olhos, e sei que, afinal, é algo tão fútil, tão "mesquinho", tão sem importância naquilo que parece ser hoje realmente importante, os futebóis, os programas da manhã e da tarde, as tricas políticas de quem manda-desmanda.
e neste mundinho pequeno e tão, mas cada vez mais tão triste, alguém diz que um poema, um texto de um heterónimo do Pessoa tem passagens (palavras) censu... omissas, a bem dos jovens estudantes que no júbilo dos seus 17 e 18 anos não podem ler, ouvir ou dizer palavras feias, quais virgens ofendidas em plena década de 40 e 50, ou mais atrás ainda nos tempos, quando era o temor a Deus e a crença cega em entidades invisíveis quem mais ordenava as massas. 
A Ode Triunfal de Álvaro de Campos terá sido certamente a escrita mais poderosa que terei lido no meu 12º ano ao ponto de me deixar apaixonada pelo seu autor. Não passará, claro está, de um elogio à revolução industrial, às maravilhas da época moderna no início do séc. XX, mas qual não é o meu espanto quando hoje, ao reler o mesmo texto, agora dito indecoroso ou impróprio para ser apresentado na sua íntegra nos livros de gentes que, de certeza, saberão já muito da vida, mas que ainda assim poderão ficar perturbados com tamanha desfaçatez do autor-poeta-louco-bêbado, vejo tantas analogias ou até mesmo semelhanças a coisas correntes, que sinto-o como um alerta de futuro, uma visão de futuro. e sim, talvez o maior receio que posso ter é que um dia, não sejam apenas algumas frases ou palavras, mas sim o todo a desaparecer, porque afinal é um texto agitador da populaça juvenil, porque poderá afinal conter ideias subentendidas nas entrelinhas imaginárias de uns quaisquer censores que assim o entendam. e só porque assim o entendam. 
O que me assusta é que o passado de terror possa estar igualmente ao virar do presente.


ODE TRIUNFAL

À dolorosa luz das grandes lâmpadas eléctricas da fábrica
Tenho febre e escrevo.
Escrevo rangendo os dentes, fera para a beleza disto,
Para a beleza disto totalmente desconhecida dos antigos.

Ó rodas, ó engrenagens, r-r-r-r-r-r-r eterno!
Forte espasmo retido dos maquinismos em fúria!
Em fúria fora e dentro de mim,
Por todos os meus nervos dissecados fora,
Por todas as papilas fora de tudo com que eu sinto!
Tenho os lábios secos, ó grandes ruídos modernos,
De vos ouvir demasiadamente de perto,
E arde-me a cabeça de vos querer cantar com um excesso
De expressão de todas as minhas sensações,
Com um excesso contemporâneo de vós, ó máquinas!

Em febre e olhando os motores como a uma Natureza tropical —
Grandes trópicos humanos de ferro e fogo e força —
Canto, e canto o presente, e também o passado e o futuro,
Porque o presente é todo o passado e todo o futuro
E há Platão e Virgílio dentro das máquinas e das luzes eléctricas
Só porque houve outrora e foram humanos Virgílio e Platão,
E pedaços do Alexandre Magno do século talvez cinquenta,
Átomos que hão-de ir ter febre para o cérebro do Ésquilo do século cem,
Andam por estas correias de transmissão e por estes êmbolos e por estes volantes,
Rugindo, rangendo, ciciando, estrugindo, ferreando,
Fazendo-me um acesso de carícias ao corpo numa só carícia à alma.

Ah, poder exprimir-me todo como um motor se exprime!
Ser completo como uma máquina!
Poder ir na vida triunfante como um automóvel último-modelo!
Poder ao menos penetrar-me fisicamente de tudo isto,
Rasgar-me todo, abrir-me completamente, tornar-me passento
A todos os perfumes de óleos e calores e carvões
Desta flora estupenda, negra, artificial e insaciável!

Fraternidade com todas as dinâmicas!
Promíscua fúria de ser parte-agente
Do rodar férreo e cosmopolita
Dos comboios estrénuos,
Da faina transportadora-de-cargas dos navios,
Do giro lúbrico e lento dos guindastes,
Do tumulto disciplinado das fábricas,
E do quase-silêncio ciciante e monótono das correias de transmissão!

Horas europeias, produtoras, entaladas
Entre maquinismos e afazeres úteis!
Grandes cidades paradas nos cafés,
Nos cafés — oásis de inutilidades ruidosas
Onde se cristalizam e se precipitam
Os rumores e os gestos do Útil
E as rodas, e as rodas-dentadas e as chumaceiras do Progressivo!
Nova Minerva sem-alma dos cais e das gares!
Novos entusiasmos de estatura do Momento!
Quilhas de chapas de ferro sorrindo encostadas às docas,
Ou a seco, erguidas, nos planos-inclinados dos portos!
Actividade internacional, transatlântica, Canadian-Pacific!
Luzes e febris perdas de tempo nos bares, nos hotéis,
Nos Longchamps e nos Derbies e nos Ascots,
E Piccadillies e Avenues de L’Opéra que entram
Pela minh’alma dentro!

Hé-lá as ruas, hé-lá as praças, hé-lá-hô la foule!
Tudo o que passa, tudo o que pára às montras!
Comerciantes; vários; escrocs exageradamente bem-vestidos;
Membros evidentes de clubes aristocráticos;
Esquálidas figuras dúbias; chefes de família vagamente felizes
E paternais até na corrente de oiro que atravessa o colete
De algibeira a algibeira!
Tudo o que passa, tudo o que passa e nunca passa!
Presença demasiadamente acentuada das cocotes
Banalidade interessante (e quem sabe o quê por dentro?)
Das burguesinhas, mãe e filha geralmente,
Que andam na rua com um fim qualquer;
A graça feminil e falsa dos pederastas que passam, lentos;
E toda a gente simplesmente elegante que passeia e se mostra
E afinal tem alma lá dentro!

(Ah, como eu desejaria ser o souteneur disto tudo!)

A maravilhosa beleza das corrupções políticas,
Deliciosos escândalos financeiros e diplomáticos,
Agressões políticas nas ruas,
E de vez em quando o cometa dum regicídio
Que ilumina de Prodígio e Fanfarra os céus
Usuais e lúcidos da Civilização quotidiana!

Notícias desmentidas dos jornais,
Artigos políticos insinceramente sinceros,
Notícias passez à-la-caisse, grandes crimes —
Duas colunas deles passando para a segunda página!
O cheiro fresco a tinta de tipografia!
Os cartazes postos há pouco, molhados!
Vients-de-paraître amarelos como uma cinta branca!
Como eu vos amo a todos, a todos, a todos,
Como eu vos amo de todas as maneiras,
Com os olhos e com os ouvidos e com o olfacto
E com o tacto (o que palpar-vos representa para mim!)
E com a inteligência como uma antena que fazeis vibrar!
Ah, como todos os meus sentidos têm cio de vós!

Adubos, debulhadoras a vapor, progressos da agricultura!
Química agrícola, e o comércio quase uma ciência!
Ó mostruários dos caixeiros-viajantes,
Dos caixeiros-viajantes, cavaleiros-andantes da Indústria,
Prolongamentos humanos das fábricas e dos calmos escritórios!

Ó fazendas nas montras! Ó manequins! Ó últimos figurinos!
Ó artigos inúteis que toda a gente quer comprar!
Olá grandes armazéns com várias secções!
Olá anúncios eléctricos que vêm e estão e desaparecem!
Olá tudo com que hoje se constrói, com que hoje se é diferente de ontem!
Eh, cimento armado, beton de cimento, novos processos!
Progressos dos armamentos gloriosamente mortíferos!
Couraças, canhões, metralhadoras, submarinos, aeroplanos!
Amo-vos a todos, a tudo, como uma fera.
Amo-vos carnivoramente.
Pervertidamente e enroscando a minha vista
Em vós, ó coisas grandes, banais, úteis, inúteis,
Ó coisas todas modernas,
Ó minhas contemporâneas, forma actual e próxima
Do sistema imediato do Universo!
Nova Revelação metálica e dinâmica de Deus!

Ó fábricas, ó laboratórios, ó music-halls, ó Luna-Parks,
Ó couraçados, ó pontes, ó docas flutuantes —
Na minha mente turbulenta e encandescida
Possuo-vos como a uma mulher bela,
Completamente vos possuo como a uma mulher bela que não se ama,
Que se encontra casualmente e se acha interessantíssima.

Eh-lá-hô fachadas das grandes lojas!
Eh-lá-hô elevadores dos grandes edifícios!
Eh-lá-hô recomposições ministeriais!
Parlamentos, políticas, relatores de orçamentos,
Orçamentos falsificados!
(Um orçamento é tão natural como uma árvore
E um parlamento tão belo como uma borboleta).

Eh-lá o interesse por tudo na vida,
Porque tudo é a vida, desde os brilhantes nas montras
Até à noite ponte misteriosa entre os astros
E o mar antigo e solene, lavando as costas
E sendo misericordiosamente o mesmo
Que era quando Platão era realmente Platão
Na sua presença real e na sua carne com a alma dentro,
E falava com Aristóteles, que havia de não ser discípulo dele.

Eu podia morrer triturado por um motor
Com o sentimento de deliciosa entrega duma mulher possuída.
Atirem-me para dentro das fornalhas!
Metam-me debaixo dos comboios!
Espanquem-me a bordo de navios!
Masoquismo através de maquinismos!
Sadismo de não sei quê moderno e eu e barulho!

Up-lá hô jockey que ganhaste o Derby,
Morder entre dentes o teu cap de duas cores!

(Ser tão alto que não pudesse entrar por nenhuma porta!
Ah, olhar é em mim uma perversão sexual!)

Eh-lá, eh-lá, eh-lá, catedrais!
Deixai-me partir a cabeça de encontro às vossas esquinas.

E ser levado da rua cheio de sangue
Sem ninguém saber quem eu sou!

Ó tramways, funiculares, metropolitanos,
Roçai-vos por mim até ao espasmo!
Hilla! hilla! hilla-hô!
Dai-me gargalhadas em plena cara,
Ó automóveis apinhados de pândegos e de putas,
Ó multidões quotidianas nem alegres nem tristes das ruas,
Rio multicolor anónimo e onde eu me posso banhar como quereria!
Ah, que vidas complexas, que coisas lá pelas casas de tudo isto!
Ah, saber-lhes as vidas a todos, as dificuldades de dinheiro,
As dissensões domésticas, os deboches que não se suspeitam,
Os pensamentos que cada um tem a sós consigo no seu quarto
E os gestos que faz quando ninguém pode ver!
Não saber tudo isto é ignorar tudo, ó raiva,
Ó raiva que como uma febre e um cio e uma fome
Me põe a magro o rosto e me agita às vezes as mãos
Em crispações absurdas em pleno meio das turbas
Nas ruas cheias de encontrões!

Ah, e a gente ordinária e suja, que parece sempre a mesma,
Que emprega palavrões como palavras usuais,
Cujos filhos roubam às portas das mercearias
E cujas filhas aos oito anos — e eu acho isto belo e amo-o! —
Masturbam homens de aspecto decente nos vãos de escada.
A gentalha que anda pelos andaimes e que vai para casa
Por vielas quase irreais de estreiteza e podridão.
Maravilhosamente gente humana que vive como os cães
Que está abaixo de todos os sistemas morais,
Para quem nenhuma religião foi feita,
Nenhuma arte criada,
Nenhuma política destinada para eles!
Como eu vos amo a todos, porque sois assim,
Nem imorais de tão baixos que sois, nem bons nem maus,
Inatingíveis por todos os progressos,
Fauna maravilhosa do fundo do mar da vida!

(Na nora do quintal da minha casa
O burro anda à roda, anda à roda,
E o mistério do mundo é do tamanho disto.
Limpa o suor com o braço, trabalhador descontente.
A luz do sol abafa o silêncio das esferas
E havemos todos de morrer,
Ó pinheirais sombrios ao crepúsculo,
Pinheirais onde a minha infância era outra coisa
Do que eu sou hoje...)

Mas, ah outra vez a raiva mecânica constante!
Outra vez a obsessão movimentada dos ónibus.
E outra vez a fúria de estar indo ao mesmo tempo dentro de todos os comboios
De todas as partes do mundo,
De estar dizendo adeus de bordo de todos os navios,
Que a estas horas estão levantando ferro ou afastando-se das docas.
Ó ferro, ó aço, ó alumínio, ó chapas de ferro ondulado!
Ó cais, ó portos, ó comboios, ó guindastes, ó rebocadores!

Eh-lá grandes desastres de comboios!
Eh-lá desabamentos de galerias de minas!
Eh-lá naufrágios deliciosos dos grandes transatlânticos!
Eh-lá-hô revoluções aqui, ali, acolá,
Alterações de constituições, guerras, tratados, invasões,
Ruído, injustiças, violências, e talvez para breve o fim,
A grande invasão dos bárbaros amarelos pela Europa,
E outro Sol no novo Horizonte!

Que importa tudo isto, mas que importa tudo isto
Ao fúlgido e rubro ruído contemporâneo,
Ao ruído cruel e delicioso da civilização de hoje?
Tudo isso apaga tudo, salvo o Momento,
O Momento de tronco nu e quente como um fogueiro,
O Momento estridentemente ruidoso e mecânico,
O Momento dinâmico passagem de todas as bacantes
Do ferro e do bronze e da bebedeira dos metais.

Eia comboios, eia pontes, eia hotéis à hora do jantar,
Eia aparelhos de todas as espécies, férreos, brutos, mínimos, Instrumentos de precisão, aparelhos de triturar, de cavar,
Engenhos brocas, máquinas rotativas!

Eia! eia! eia!
Eia electricidade, nervos doentes da Matéria!
Eia telegrafia-sem-fios, simpatia metálica do Inconsciente!
Eia túneis, eia canais, Panamá, Kiel, Suez!
Eia todo o passado dentro do presente!
Eia todo o futuro já dentro de nós! eia!
Eia! eia! eia!
Frutos de ferro e útil da árvore-fábrica cosmopolita!
Eia! eia! eia! eia-hô-ô-ô!
Nem sei que existo para dentro. Giro, rodeio, engenho-me.
Engatam-me em todos os comboios.
Içam-me em todos os cais.
Giro dentro das hélices de todos os navios.
Eia! eia-hô! eia!
Eia! sou o calor mecânico e a electricidade!

Eia! e os rails e as casas de máquinas e a Europa!
Eia e hurrah por mim-tudo e tudo, máquinas a trabalhar, eia!

Galgar com tudo por cima de tudo! Hup-lá!

Hup-lá, hup-lá, hup-lá-hô, hup-lá!
Hé-la! He-hô! H-o-o-o-o!
Z-z-z-z-z-z-z-z-z-z-z-z!

Ah não ser eu toda a gente e toda a parte!

                        Londres, 1914 — Junho.


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Sunday, January 13, 2019

Leituras
January 13, 20190 Comments
Resultado de imagem para nove mil passos livroEm Portugal, o séc. XVIII, terá sido certamente o mais importante, o que maior projecção nos deu enquanto império. Uma época de pujança, riqueza, excessos, igualmente das maiores criações e construções que nos deram monumentos que, muitos séculos depois de nós pisarmos esta terra, perdurarão para as gerações futuras se deslumbrarem e interrogarem como é que gente acabada de sair da idade média, teve capacidade para tais empreendimentos. Falo do Convento de Mafra, do Aqueduto das Águas Livres, da Biblioteca Joanina, (entre outros), sendo estes os símbolos maiores das ideias de um rei dito Sol, à escala nacional e natural de comparação com o Rei-Sol francês Louis XIV, custeados com as especiarias e tecidos do Oriente, ouro e diamantes do Ocidente Brasileiro, coincidindo com uma emigração feroz de cerca de 300 mil pessoas em cerca de 5 anos para esse país desconhecido, bárbaro, mas igualmente rico e fascinante, mas também, porque não nos devemos (mais de podermos) esquecer, para o pior, mas espero que para o melhor, à custa do tráfico e tráfego de escravos africanos para as terras de uma América que já não era fim de mundo. E aqui permitam-me o aparte, mas se ao mesmo tempo nos devermos envergonhar desse nosso passado atroz (tão impiedoso quanto aceitarmos anos e anos a fio uma Santa Inquisição julgar e matar sem razão gente várias, pendurada em paus e queimada viva em fogueiras, em espectáculos de horror que quem via exibia o júbilo dos loucos), agradeço-lhe a existência por me ter permitido identificar e reconhecer sons, ritmos e uma cultura tão genuínas no outro lado do Atlântico. 
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Mas voltando ao essencial, foi este mesmo D. João V, capaz de tanto ou de tentar tanto, pese embora a forma, sabendo nós que para grandes feitos, muito sofrimento se provoca, que também mais amou a outra, a freira, a puta, a rameira, a que tinha mau feitio. Essa Paula que durante 13 anos foi-lhe confidente de cama, de travesseiro, de política, de histórias de maldizer. Havia quem dela dissesse o pior, mas, na minha humilde opinião, e como quase em tudo na vida que começa com maledicência, o que de facto a Paula ou a Madre Paula, a freira de Odivelas mais famosa da História de Portugal, dava às pessoas era medo pelo poder que tinha em relação ao Rei e inveja, exactamente pelo poder que ele, nela, confiava. 

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Sendo que a idade média passando para o Renascimento serão os temas que mais leio (venham de lá esses romances todos, e exceptuando aquela fase da Segunda Guerra Mundial), deixo aqui três livros  que acho serem um bom ponto de partida para este mundo... e para o mundo da Paula, que a meu ver terá sido uma das mulheres de segundo plano, de baixo nível, de estrato social inferior, com mais influência numa época de Homens. 





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Wednesday, January 09, 2019

Escrever, ler, ver o Mar
January 09, 20190 Comments
Começo pelo fim: na passagem de ano, uma das melhores que tive em muitos anos, com as pessoas de quem mais gosto (ou pelo menos as mais importantes num espetro não muito vasto de grandes mas essencialmente, verdadeiros amigos - daqueles que mesmo não falando meses, sabemos que estão lá para nós e que nós estaremos lá para eles), em casa, a ver o fogo de artifício a partir da televisão, resolvi para mim que o que eu mais desejava para 2019 seria sobreviver um dia de cada vez, porque, como já mencionei em publicações anteriores, os últimos 3 anos têm sido, tudo, menos pacíficos, e porque, por motivos de ordem pessoal/profissional, os próximos tempos também não se avizinham melhores. 
Agora o início e esperando não me repetir: desejei apenas "um dia de cada vez" porque no passado mês de Setembro, devido a uma situação por mim desencadeada, coloquei todo um crescimento e desenvolvimento profissionais em jogo, não só para quem em mim confiava, mas acima de tudo, para o EU que queria ir mais longe profissionalmente, que queria ser vista como uma geóloga competente, que queria ser uma mais valia na empresa onde estou a trabalhar, como noutras onde possa vir a ter algum cargo técnico. Posso estar a exagerar, claro, posso estar completamente errada e, a competência do meu trabalho nem sequer ter sido colocada em causa, mas sinto que ao ter falhado no básico, na confiança de pessoas que me são próximas, que sempre me apoiaram e deram a mão (muitas vezes me defendendo), estive mal, procedi de forma errada (não cheguei a pedir desculpa) e sinto uma culpa gigante. Ao mesmo tempo esta experiência mostrou-me finalmente que em empresas pequenas, as verdadeiras caras revelam-se quando as coisas não estão a correr bem; as máscaras caem quando menos se espera, e tudo se torna mais feio, mas também mais real. 
O Realismo leva-me então a não desejar nada, a não querer nada, a não ansiar por nada. Nada nos é colocado nas costas que não possamos aguentar no final do dia, embora eu me sinta sempre defraudada com as pessoas, por achar, ingenuamente, que posso confiar nelas também. 
Então não mais quero do que escrever enquanto me/nos é permitido, sem falsear acima de tudo o que eu penso. Quando, também em Setembro, deixei de ter perfil activo no Facebook - essa primeira rede social que usei desde o seu boom e que vim a observar servir para determinados fins pessoais, estabelecer determinados estilos e comportamentos, e claro, resultar em insultos a quem pensa diferente (e quando escrevo diferente, é mesmo diferente, do que eu possa pensar ou do que vocês podem pensar, e como tal, insulta-se, ponto!), fora servir também para estar atento ao que os colegas do trabalho escrevem ou partilham e poder usar isso como arma/desefa futuras -, pensei seriamente que pelo menos, no blog, nunca tive problemas em partilhar as minhas ideias ou opiniões. O blog é também um espaço publico-privado, mas o campo de observadores/ leitores, poderá ser mais reduzido e facilmente controlável. O que mais me assusta ou assustava no Facebook era a capacidade que todos tínhamos em chegar ao perfil privado de "amigos" e comentar ou contra-argumentar de forma quase irracional tanto quando impulsiva, o que cada um poderia escrever e, geralmente, pensar. Mais longe era mesmo comentar algo em páginas de pessoas ou instituições que não conhecíamos de todo, apenas e só pela liberdade de o podermos fazer. Mas sem dúvida que todos os limites de bom senso, fronteiras de liberdade de expressão se foram perdendo. No blog, o conceito de poder ser um quase diário, ajuda a manter o equilíbrio necessários para, "quem não gostar, não ler". 
Pressuposto 1: escrever mais em 2019 (no blog, do diário gráfico também, embora acabe sempre, agora, por ser mais fácil pegar no mundo digital)
Pressuposto 2: ler mais em 2019. Tudo o que me possa interessar, porque também me obriga a Pensar mais.
Pressuposto 3: ver o Mar. Desde que me lembre, o Mar faz parte de mim, de quem eu sou. Mesmo estando noutros países, sempre lhes vi o mar, ou o "toquei". Porque não há melhor calmante ou conselheiro. Porque na sua brandura ou tempestade, impõe-nos respeito, e necessariamente faz com que coloquemos tudo em perspectiva. 
Mas a verdade é esta, perante tudo o que já passei, pelo que me foi ensinado em chapadas sem mão, em conversas brutais, que com poucas palavras, me deram feridas para a vida, prefiro, finalmente, viver cada coisa à medida que ela apareça. Tendo o Mar como datum de referência, e o Norte como ponto cardeal. 
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Monday, January 07, 2019

Marcelo telefona a Cristina e a casa quase foi abaixo...
January 07, 20190 Comments
De tantos assuntos deveras mais importantes que poderia aqui escrever, não tenho como escapar ao que de facto parece ser mais interessante na vida cultural e televisiva portuguesa. Se na semana passada foi o Mário Machado ter sido convidado ao programa do Goucha, ou o Goucha na véspera de Natal ter entrevistado o Presidente da República, hoje cai "o Carmo e a Trindade" pelo Presidente ter telefonado em directo para o novo programa da Ferreira, sem ela estar à espera, para lhe desejar tudo de bom no novo programa. Há quem lhe chame de populismo, há quem lhe chame de narcisismo, há quem lhe chame chamariz de audiências, há quem pense (e aí concordo mais) que se calhar o PR poderia ter também este tipo de atitudes para com outros programas, apresentadores, ideias, conceitos, conteúdos televisivos, etc.. Porque a verdade é esta, por muito bons que sejam a Cristina ou o Goucha, ou a Furtado, ou o Malato, ou a Ribas, ou seja quem forem os apresentadores e equipas técnicas por detrás de tudo aquilo, o presidente não se pode esquecer que, apesar de toda a sua boa vontade, já deixou há uns anos de ser comentador televisivo, passando a sua responsabilidade prática e social a serem outras. Não estou nem a favor, nem contra - acho aliás, que mais cedo ou mais tarde terei de escrever algo sobre a Cristina Ferreira, porque realmente é espantoso como ainda dizem que as mulheres, para chegarem a determinado patamar, precisam de subir (quase obrigatoriamente) pela horizontal, e não admitem que possam ter uma valia, inteligências, força de trabalho, preserverança, eficácia, tão enormes como as dos homens. Se a Ferreira fosse O Ferreira, de certeza que ninguém comentava, ninguém falaria do salário (e caso fosse possível, cada aventura romântica desse mesmo senhor imaginário, seria vista como façanha de homem que não assenta, mas que nem por isso deixa de ser de valor e trabalhador, e até mesmo, muito boa pessoa). 


Não, meus caros, antes que atirem pedras à Cristina ou ao Marcelo, deveriam era perguntar porque razão o Mário Machado teve direito de antena num programa visto por uma enorme parte da nossa população? Isso sim populismo directo e intencional numa época em que se observa um mais crescendo nos grupos, ideias e ideais de extrema direita, com premissas que, por sermos politicamente corretos, dizemos abominar, mas por detrás das cortinas da casa, sentadinhos no sofá ou com contas falsas de Facebook, somos dos primeiros a dizer que os gays são uma desgraça para a sociedade, que as mulheres deveriam estar cada vez mais recatadas, que entre homem e mulher não se mete a colher e que por cada português eram precisos 10 Salazares. 
O que é que interessa se o Professor Marcelo ou Presidente Marcelo telefona à Cristina ou é entrevistado pelo Goucha? Nada! Ou quanto muito, falarmos sim, mas pelos motivos acima - não é criticar pelo simples gosto de criticar, porque é bom dizer mal e sentimo-nos superiores por insultarmos os outros. Até porque, por detrás de cada insulto grave que leio, vejo muita inveja e aspiração frustrada; exactamente: vejo frustração. As mulheres que gostariam de ter sido mas porque a vida, ou por opções próprias ou por exigências familiares/ sociedade/ sociais e enconómicas, nunca conseguiram fazer nada de extraordinário, os homens, porque vivem frustrados em relacionamentos monótonos, e gostariam de ver mais Mulheres  - REALMENTE - capazes em casa, ou no local de trabalho, e mesmo quando as vêem têm medo - e o mais fácil é cair na malidicência ordinária e óbvia. 
O que deveria de acontecer, era por cada homem, nós sermos 10 Cristinas Ferreiras em potência ou, para não dizerem que estou a exagerar, deveríamos querer fazer mais com as nossas valias enquanto respresentantes do género Feminino, com o que sabemos fazer, e não é preciso sempre ou quase sempre ter um curso superior (porque muitos homens também não o têm). Porque às vezes é preciso subir a pulso, engolir comentários e perceber que as atitudes ficam para quem as pratica. Sermos preserverantes e lutarmos (taco a taco no grau de trabalho e de capacidades), exigirmos os nossos direitos quando e só quando concretizamos determinados patamares  - não será justo Mulheres e Homens terem os mesmos resultados se não estão ao mesmo nível. Mas acima de tudo perceber mesmo, que na vida, no trabalho, na amizade e no amor, nem sempre vale tudo, e nem sempre se deve confiar em toda a gente. 
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