A (não) abdicação - Cláudia Paiva Silva

Friday, January 10, 2020

A (não) abdicação

Acabei de ler "Neste tipo de atitudes é que se percebe como Meghan não pertence à realeza". Goste-se ou não da americana independente, acho mais correto aplicar esta mesma declaração à atual Rainha de Espanha. Lá está, gostos são gostos e opiniões são opiniões. Contudo, é realmente surpreendente a forma como Meghan tem conseguido desde que apareceu, mudar tudo à sua volta. Se para melhor ou pior, que interessa? Num país que se está a aproximar muito de um Estado nacionalista (e porventura tão ou mais de direita do que no tempo de Chamberlain), acho que este "Exit" de dois membros da Casa Real deveria realmente ser a menor das preocuções gerais. Contudo, claro que não deixa de ser algo ridículo e alvo fácil e inevitável de qualquer conversa. Ninguém sai de uma das monarquias mais antigas do Mundo sem mais nem menos, só porque se quer. E quando isso acontece é geralmente pelo pior do motivos - não creio que seja o caso atual. Ela era famosa, embora medianamente, no outro lado do Atlântico apenas. Ele é apenas um dos filhos da Princesa Diana. E assim se diz tudo! Ela pensava que iria conseguir ser famosa deste lado do Atlântico também, mas esqueceu-se que não era apenas cá, e sim em todo o Mundo. Ela entrou na "Famiglia" e foi aceite e bem acolhida, mas não soube como lidar com a pressão. E claro, deve ter um feitio muito diferente do da cunhada - só que a cunhada (que, espera, também não pertencia à realeza), teve de se fazer à vida e namorou quase 10 anos com o herdeiro ao trono (e não apenas 2), logo, teve mais do que tempo para se prepara(rem) ao que daí resultava. E mesmo assim acredito que não se preste a tudo e que quando não gosta de alguma coisa, também o demonstre, nem que seja à maneira mais britânica possível. 


Dizer-se à boca larga que ele abdicou por amor talvez não seja completamente errado. Harry sempre foi o rebelde dos Windsor, o que fumava, o que bebia, o que teve mais namoradas, o que foi para a guerra, o que se dedicou às causas humanitárias (mais visíveis), por isso não é de estranhar que tenha escolhido como parceira alguém com um espírito guerreiro, livre. Mas também deveria saber o que isso implicaria - não nele, mas nela. Deveria saber que ela teria de abdicar de praticamente tudo e ainda ser aceite numa terra onde de repente querem expulsar os estrangeiros indesejados. E ela além de não ser britânica, nem da Commonwealth, é afro-descendente, o que para se calhar 98.9% da populaça que liga a essas coisas, deve calhar muito mal. Se ele escolheu abdicar, terá sido por amor sim. 
Eu não gosto nem desgosto da moça, embora assuma que, a meu ver, este papel, de todos os que protagonizou, é o que lhe assenta pior. Acho que realmente é outra miuda que não sabia ao que ia, que achava que seriam só coisas boas (ou poucas coisas más) e vida de princesa e afinal enganou-se redondamente, mais ainda num país que não a quer lá, nem a ela, nem a ninguém que não goste de fish&chips (estou a generalizar claro. Nem todos os ingleses devem ser xenóbofos ou racistas ou nacionalistas radicais). 
De qualquer forma, e tenham eles todas as razões do mundo, não é assim tão fácil e muito menos da forma como andam a fazer as coisas. A ser verdade que não passaram cartão à família (dele), à Firma (onde ele pertence e como Diana a tratava), nem à Rainha, não podem ou devem escrever frases bonitas a dizer isto e aquilo, como se amanhã saíssem do palácio e fosse para o apartamento. Como se hoje andassem com guarda-costas e amanha pudessem ir ao supermercado sozinhos. Ela até pode estar habituada (a cunhada também o fazia), mas isso era "dantes". E em como todas as nossas histórias de vida, "dantes é que era bom. Antes e abdicarem, outros Brexits irão ocorrer. Por agora terão de esperar, entre o chá das cinco e as visitas oficiais em agenda e protocolo. 

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