As primeiras lembranças que tenho da minha infância, são da região de Trás-os-Montes. Mais precisamente, da aldeia de Lamego. Meu primeiro gole de vinho do Porto foi ali pelos 11 ou 12 anos de idade. Nunca mais deixei de apreciá-lo. E ao observar o meu avô, aprendi com ele a derramar um pouco de vinho tinto à sopa. E quieto, observava a elegância do “velho Rocha”, como meu avô José era conhecido. Sempre de fato, chapéu e bengala, como se, mesmo aos 70 e tantos anos, a qualquer momento ainda lhe fosse possível fazer uso da bengala para, mais uma vez, dançar a dança do pau e cortejar alguma solteira.
Essa foi a minha infância. Que no entanto, foi passada longe, muito longe de Lamego, de Trás-os-Montes e de Portugal. Nasci no Brasil, na Vila Maria, bairro de imigrantes portugueses na cidade de São Paulo. Cresci na companhia do meu avô, já viúvo da dona Maria Conceição Encarnação, minha avó nascida em Coimbra. Cresci também cercado das histórias, dos aromas, dos sabores e das imagens de um Portugal que eu só tinha na minha imaginação e na admiração que nutria pelo meu avô.
Nesta sexta-feira, o jogo Portugal x Brasil vai ser muito difícil. Não me refiro aqui ao desafio dos jogadores de ambas as seleções, que vão encarar a partida com técnica e profissionalismo. O jogo vai ser difícil para mim, que pessoalmente nunca olhei para o meu avô ou para a minha infância com técnica e profissionalismo.
O Celso Grecco, adulto e brasileiro vai querer torcer pelo Brasil. Mas aquele “Rocha” preservado ali no meio do meu nome e da minha história, vai-me provocar: torcer contra o meu avô? Como posso? Vovô, fazemos aqui um pacto: Lembra-se de quando eu era ainda miúdo e nos jogos de tabuleiro o senhor me deixava ganhar, para minha alegria, fingindo surpresa com a sua derrota? Pois façamos aqui um pacto. Hoje estaremos novamente, frente a frente numa disputa. E quem perder, finge surpresa com a derrota, combinado?
Celso Grecco/ Bolsa de Valores Sociais
Antonio Tabucchi
4 weeks ago
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