O Natal tende a juntar pessoas. Ou pelo menos seria esse o objectivo. Contudo, a meu ver, as pessoas deveriam juntar-se ao longo de todo o ano e não apenas em alturas específicas. Principalmente alturas em que penso que seja o Pior e não o Melhor de nós a vir ao de cima. Nos ímpetos de um universo de consumo, de querer tudo e mais alguma coisa, de sermos os melhores, de não olharmos para o lado com medo de perder o lugar na fila, acabamos por nor tornar monstros. Somos maus, mas pior que isso, somos cínicos, quando deveríamos ser verdadeiros uns para os outros.
Dito isto, é nesta altura em que acontecem todos os jantares e todos os reencontros. Não vou contra a maré. É realmente nesta altura do ano em que consigo reunir os meus amigos de sempre, mas não tenho já grande paciência para os jantares das empresas, muitas, com as quais cresci.
Simplesmente porque é exactamente no seio de gente que mal te lembras, que ocorrem as grandes cenas, o "diz que disse", o tal cinismo tão desnecessário. Claro que me poderia recusar a ir, mas faço-o por motivos familiares. Não serão dois dias que me irão retirar a paciência que começa a rarear. Exactamente porque vejo a impaciência com que os que me rodeiam actuam. Desejam-se para sair de um comboio apinhado, muitas vezes ficando junto das portas e tapando lugar a pessoas que querem entrar, passam a correr passadeiras com sinais vermelhos, gritam e xingam quem apanha um táxi antes deles, mas depois, com a maior das calmas circulam pela cidade, parando de repente, não tendo respeito por quem esteja atrás, por quem queira sair nas paragens antes das deles, porque não sabem se a pessoa que apanhou o táxi o fez por distracção ou por urgência.
Andamos numa roda viva de sentimentos negativos. Não podemos ver ninguém a sorrir ou a rir à gargalhada que só nos ocorre dizer "a tua vida deve correr-te mesmo bem, deves estar cheio de saúde ou de dinheiro". Se calhar a pessoa ri exactamente para não chorar, ou para libertar parte dos problemas acumulados. Cara feia não resolve nada. Então porque a fazemos aos que nos rodeiam? Porque temos inveja? Não deveríamos praticar o mesmo exemplo? Ouvir música, ler um livro, rir de uma mensagem tonta ou amorosa?
O Natal é pois uma falácia. Um encapotamento do real fundo de cada pessoa sem excepção. Uns conseguem guardar mais, outros menos, mas basta realmente ver os comportamentos por vezes animalescos que se têm em estabelecimentos de consumo. O nervosismo das prendas compradas em últimas hora, para passadas 48, começar a loucura das trocas e saldos.
O nervosismo do Natal é a continuação natural do nervosismo do dia a dia que não pode ser desculpado pela "época do Ano".
O melhor mesmo é respirar fundo e deixar a loucura extra passar.