Lembrança dos tempos de Guerra - Cláudia Paiva Silva

Tuesday, March 08, 2022

Lembrança dos tempos de Guerra



Nem sempre o Amor é suficiente para impedir a Dor. Nem sempre a Paz resulta contra a Guerra. E muito menos, quando se pretende liberdade, esta poderá ser facilmente conseguida. É engraçado, embora não menos irónico, que as relações tóxicas e violentas se possam parecer tanto com países que invadem os outros porque insistem que são "seus", que fazem parte de si, enquanto partes de um puzzle imperial, de uma nova ordem mundial. E que isso seja sempre, mas sempre violento, tirânico. 

Quando a 27 de Janeiro foi inaugurada a exposição Last Folio com videografia de Katya Krausova e do fotógrafo Yuri Dojc, ambos naturais da antiga Checoslováquia, e também eles emigrantes forçados devido à entrada da União Soviética na região nos anos 60, certamente nunca pensámos que o cenário europeu pudesse ter mudado tão rápida e drasticamente. 

O seu trabalho, destacando as zonas de infância de Yuri, na agora Eslováquia oriental, demarca a cidade de Bardejov, localizada na fronteira com a Polónia. Comum a todas as exibições análogas, Last Folio deveria ser uma homenagem à sobrevivência, mesmo que sob a forma de livros, cuja SS nazi durante a Segunda Guerra Mundial não conseguiu queimar, ou destruir. Encontrados por acaso na antiga escola judaica, restavam apenas para ser fotografados várias obras em hebraico, religiosas e não só, comprovando a existência em décadas idas de uma larga comunidade judaica na região. Contudo, bastou uma manha para que as crianças fossem colocadas num comboio e encaminhadas para Auschwitz. Nenhuma sobreviveu. 

Last Folio - a última folha, corresponde assim a uma brilhante obra fotográfica e de celebração cultural, cujos protagonistas resistentes são os livros que foram sendo comidos pelo tempo, terminando apenas na matéria invisível que nos toca a todos. Pó e átomos. Curiosamente, aprende-se que Natureza não come "letras", a química associada à tinta das palavras é demasiado tóxica, pelo que algumas palavras ficam para sempre - e não é assim que a História é feita?

No dia de hoje, menos de 2 meses depois da sua abertura, corre ser essencial voltar a falar da sua importância. Para que a memória seja resgatada, para que nunca nos esqueçamos, para impedir o quê? A memória do homem é curta. A sua sede de Poder é enorme. 

Ainda assim, atos de resistência. 

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